É perfeitamente compreensível. Afinal, Bin Laden é o símbolo máximo da grande ameaça que tem pairado sobre os EUA ao longo dos últimos anos.
O primeiro ponto para o qual quero chamar a atenção, no entanto, é que, ao contrário do que anunciou o Presidente Obama, não foi feita justiça. Não há justiça no assassínio de um homem, por monstruosos e incomensuráveis que os seus crimes possam ser. Tirar a vida ao próximo, por muito natural e humano que seja esse instinto em face da ameaça, não é uma resposta, não é um caminho que, em liberdade e consciência, possa ser escolhido.
O segundo ponto tem a ver com a questão da ameaça. O perigo não desaparece hoje do horizonte dos EUA. Osama bin Laden deixou hoje de ser uma ameaça, mas outros se levantarão e tomarão o lugar dele. Porque ontem Bin Laden já não era tanto a ameaça como o símbolo dessa ameaça: os EUA continuarão a ter inimigos exteriores, que lutarão para privar o povo americano da sua liberdade, que continuarão a odiar o País e, por inerência, os seus cidadãos.
Mas continuarão, sobretudo, a ter inimigos internos: todos aqueles que, tendo cidadania norte-americana se opõem a um caminho de maior liberdade e fraternidade, que exploram a maioria do seu povo, que fazem uso indevido dos recursos, que pelas suas acções e omissões constroem uma sociedade menos livre. O perigo reside tanto do lado de cá do Atlântico como nas cidades e vilas da América.
Termino com um desejo, uma esperança: possam os EUA fazer deste dia simbólico o pontapé de saída para a mudança real e efectiva na maneira como conduzem a sua política externa, promovendo de facto a liberdade dos povos e a paz entre as nações. Mas não se pode querer salvar o mundo, se não se tem a legitimidade e a capacidade de se salvar a si próprio. A mudança tem de começar a partir de dentro.