Apesar de os hospitais serem um importante componente dos sistemas de saúde e centrais no processo de reforma do mesmo, como instituições (individualmente), têm recebido muito pouca atenção por parte dos decisores políticos.
Várias razões são apontadas para o facto de serem indispensáveis ao processo de reforma do sistema de saúde:
1 - Os hospitais concentram entre 50 e 70% do orçamento total para a Saúde (nos países da União Europeia);
2 - As políticas que os hospitais adoptam têm maior impacto em todo o sistema, pois estão numa posição central, em termos organizacionais, uma vez que são responsáveis pelos últimos graus de prestação de cuidados de saúde: os cuidados especializados/diferenciados;
3 - Os avanços tecnológicos e farmacêuticos, assim como uma maior atenção à Medicina Baseada na Evidência (MBE), significam um maior impacto dos serviços hospitalares na saúde das populações.
O sistema hospitalar reflecte a cultura e a história de cada país, assim como a ideologia política em que se baseia o seu sistema de saúde, havendo uma diversidade enorme entre os diferentes países europeus quanto à importância estratégica dos hospitais na prestação pública de cuidados de saúde.
Deste modo, embora muito se possa reter acerca das reformas e opções políticas tomadas noutros países ao longo da sua história, estas não podem (ou não devem) ser aplicadas cegamente num contexto nacional nem local diferentes! É essencial, numa reforma hospitalar consciente e coerente, abordar um hospital no seu contexto geográfico e populacional, sem estabelecer graus de comparação com hospitais semelhantes (muito menos, como se tem feito, com hospitais de diferentes dimensões).
Como exemplo, a questão de quantas camas são as ideais por cada hospital necessita de uma abordagem individual e crítica aos estudos que são efectuados noutros contextos organizacionais.
Outro exemplo é o das reduções em profissionais de saúde. No Reino Unido e nos Estados Unidos da América (EUA), as reduções feitas em profissionais de saúde (não acompanhadas pela redução de doentes que acederam aos hospitais), à semelhança do que aconteceu nos países da antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), conduziram a uma diminuição abrupta da qualidade de prestação de cuidados de saúde na década de 90.
Muitas definições se podem atribuir aos hospitais. Segundo Miller (The Bird of the hospital in the Bizantine Empire), os hospitais são instituições que facultam alojamento, alimentação, cuidados de enfermagem contínuos para os seus utentes e cuidados médicos especializados, tendo uma função de restauração da saúde dos indivíduos. No entanto, esta definição apenas capta o essencial. A diversidade é tal que, como diz Thubron (In Siberia), “um hospital da Sibéria é um edifício com 10 camas, sem abastecimento de água, localizado numa aldeia com poucos habitantes”. Um conceito bem diferente daquele que é considerado nos países desenvolvidos.
Há ainda que ter em conta que, mesmo na Europa, existem países que investem cerca de 50€ por pessoa/ano nos hospitais, enquanto outros têm investimentos de cerca de 14.000€!
Como refere Hillman (Reestructuring hospital services), apesar das intervenções clínicas (médicas e cirúrgicas) não poderem ser implementadas sem estudos científicos rigorosos e aprovados por instâncias oficiais, “racionalizamos, mudamos e implementamos novos sistemas (de saúde), muitas vezes baseados em imperativos económicos e políticos, e raramente avaliamos o seu impacto nas pessoas”. Precisamente porque é uma organização muito complexa é que o investimento em estudos organizacionais deveria ser maior e individualizado! Como podemos ver pela tabela seguinte (número de artigos de investigação em hospitais nos tópicos referidos), não há uma base científica sustentável das opções políticas para o sistema hospitalar na maioria dos países da OCDE.
Em Portugal, apenas estão disponíveis 3 estudos do género em 3 hospitais diferentes, os quais nem abordam estes temas, centrando-se na eficiência hospitalar, com uma abordagem crítica face à actividade clínica e não face à gestão da organização de saúde em si, nem tão pouco analisam hospitais de dimensões nem de abrangência de população analisada idêntica.
Na análise do sucesso de um sistema hospitalar, devemos individualizar o mais possível, isto é, ter em atenção a população servida, as doenças mais prevalentes nas diferentes regiões, as expectativas das populações, entre outros factores. Só assim se conseguirá perceber e criticar a forma como está instalada uma rede hospitalar num determinado país, segundo o tipo e a função de cada hospital.
É difícil cruzar dados fiáveis entre países sobre a actividade hospitalar, visto que não adoptam os mesmos indicadores de avaliação de eficiência e/ou diferem na amostra de tipos de hospitais para estes estudos: alguns países excluem o sector privado ou outros sectores, como os hospitais militares; enquanto outros países consideram toda a capacidade hospitalar existente em território nacional.
A capacidade hospitalar tem vindo a ser reduzida pela maioria dos países da UE, sobretudo devido a políticas de redução do tempo de permanência em internamento por doença aguda e da transferência de doentes de longa duração para instituições especializadas nesse acompanhamento.
Segundo Mossialos & Le Grand (Funding Health Care: options for Europe), a redução de camas não tem, contudo, sido acompanhada pelo encerramento de hospitais, não havendo uma poupança de custos significativa, pois a “grande parte das despesas hospitalares derivam de outros gastos fixos”.
Na Europa, apenas o Reino Unido e a Irlanda conseguiram poupanças significativas, porque encerraram cerca de um terço dos seus hospitais (entre 1980 e os primeiros anos da década de 90)
Em França (assim como em Portugal, na última década), os hospitais instalados nas mesmas cidades estão a ser agregados em “hospital trusts” (Centros Hospitalares), uma política que se revelou mais fácil de executar do que o encerramento de uma determinada instalação hospitalar.
Esta mesma estratégia foi seguida em Melbourne (Austrália), em 1995, agregando 32 hospitais do sector público em 7 Centros Hospitalares, resultando no encerramento de 9 instalações e em reconfigurações importantes na organização interna.
Como podemos ver pelo esquema seguinte, são muitas as pressões para as reformas dos sistemas hospitalares. Desde pressões externas (demográficas, doenças mais prevalentes em diferentes regiões, expectativas das populações, financeiras, entre outras) a pressões internas (evolução das tecnologias e conhecimento clínico, número de profissionais de saúde e suas expectativas pessoais, entre outras).
Os sistemas hospitalares devem por isso ser abordados pelos decisores políticos considerando toda a sua complexidade, e só assim se conseguirão efectuar mudanças sustentáveis.
De referir ainda todas as possíveis dimensões na avaliação de um hospital:
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