segunda-feira, 17 de outubro de 2011

O nosso mercado paralelo: como roubar um Estado

Este texto tem dupla autoria: Sérgio Seco Nabais e Hugo Ribeiro. Foi feito no início de Setembro, perspectivando-se que seja publicado na próxima edição do Jornal Universitário de Coimbra "A Cabra".
Infelizmente, não nos foi possível encontrar um gráfico que melhor traduzisse a estimativa de crescimento do nosso mercado paralelo ao longo dos anos.
Certo é que o nosso PIB (Produto Interno Bruto) se situará perto dos 160 mil milhões de euros e tem sido difundido pelos meios de comunicação social, todos os anos (sobretudo na última década), um aumento exponencial da fuga ao fisco, estimando-se que o nosso mercado paralelo valha hoje qualquer coisa como 40 mil milhões de euros.
Perspectiva-se ainda um grande agravamento da situação nos próximos anos, devido ao plano de resgate financeiro a que estamos sujeitos e que implica medidas asfixiantes para a nossa Economia...

Eduardo Catroga, a 5 de Maio de 2011 (um mês antes das eleições), numa entrevista à TSF, prometia que o PSD liderado por Pedro Passos Coelho iria derrubar o "Estado gordo" e "atacar ferozmente todo o mercado paralelo"

          
                    A todos nós se exigem sacrifícios em nome da solidariedade nacional para com o pagamento do desastre em que nos encontramos.

            Mas todos temos também o direito de exigir mudanças profundas, começando pela miscelânea de tiques da nossa classe política e pelos vícios de um sistema democrático caquéctico.

            O nosso mercado paralelo é um roubo diário, económico e ético. É de uma injustiça atroz para todos nós mas, infelizmente, todos nós contribuímos para ele. Estima-se que represente cerca de 40 mil milhões de euros anuais (e, nos últimos anos, tem vindo a aumentar exponencialmente), sendo os ramos da restauração e o do mercado arrendatário os que contribuem mais para esta fuga ao fisco. 

        Alguns economistas têm mesmo afirmado publicamente que bastava ao Estado conseguir cobrar impostos a metade deste volume de negócios para que o país deixasse de pensar em défice e começasse a falar em crescimento e, quiçá, em superávit.

            Mas, afinal, porque é que estamos todos em “conluio” com esta situação? É simples. Pensemos num qualquer dia desta semana e nos gastos que tivemos nesse dia. A seguir, reflictamos: quantas vezes pedimos factura?

            De uma amostra pequena (duas pessoas: os dois autores deste texto), tirámos esta conclusão: pedimos factura (quando pedimos) apenas nas despesas que poderão ser introduzidas na declaração anual de IRS (fundamentalmente: saúde e educação). Mas, então, por que é que não o fazemos em todas as outras despesas?

            É que, se não o fizermos, estamos a compactuar com esta fraude. Façamos esse esforço! E, cada um de nós poderá facilmente fazer as contas: quantos impostos poderemos assim possibilitar que sejam arrecadados, tal como devem sê-lo? Comecemos pelas fotocópias que tiramos num qualquer centro de cópias, pelas rendas mensais que pagamos aos nossos senhorios, passemos pelos almoços e jantares em restaurantes, pelo supermercado, ou por um simples café…

            É importante termos todos conhecimento que a não emissão de factura permite, por um lado, a dispensa do pagamento de IVA, enganando o Estado e, por outro lado, a “maquilhagem” da respectiva contabilidade, defraudando gravemente o fisco, no que diz respeito ao real valor dos rendimentos obtidos e tributáveis.

            Exigirmos mudanças de comportamentos “lá em cima” não nos exime de uma justa auto-crítica.

          Mas podemos fazer mais! Podemos (e devemos) exigir que a facturação seja obrigatória para qualquer serviço prestado, ou seja, podemos exigir uma mudança na lei e penalizações para quem não a cumpra deste modo. Afinal de contas, eu pago os meus impostos, tu pagas os teus… Por que raio permitimos que alguns não paguem os deles?

            Mas, por enquanto, não nos esqueçamos: uma factura, para ser factura, tem que ser um papel em que seja nítida a inscrição “Venda a dinheiro”.

Sérgio Seco Nabais e Hugo Ribeiro

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