sábado, 19 de fevereiro de 2011

Ética e Cidadania

Vivemos hoje num mundo de incertezas, em plena crise, não só económica, não só de valores, mas também de identidade. Torna-se cada vez mais difícil diferenciarmo-nos do colega na secretária ao lado (ou pior, do número anterior ao nosso na fila do Centro de Emprego), diferenciarmos o Pais dos últimos valores dos juros da dívida pública, diferenciarmos o mundo de uma avalanche de acontecimentos que deixam muitas dúvidas sobre o nosso lugar daqui por dez dias, dez meses ou dez anos...


Este é um tempo de crise, um tempo de dúvida, um tempo de perigo. De acordo! Mas não podemos baixar os braços e considerar que este seja um tempo de desesperança, de derrotismo ou de angústia! Cada crise é sempre ocasião de uma nova oportunidade, uma ocasião para nos reerguermos, uma ocasião para tomar um novo rumo.


Como o conseguiremos? Com trabalho, com esforço e muito empenho, sem dúvida! Mas a resposta está, creio, para além disso: há que fazer toda uma refundação, todo um investimento em valores que, ao longo dos últimos anos, acabaram por perder o seu espaço.


Falo aqui de um exercício de Ética e de Cidadania.


A Ética, como “cola” de todo o nosso tecido social, não como um manual de boas práticas (muito menos, um conjunto de regras rígidas), mas como o conjunto de imperativos que condicionam a nossa acção. Muita gente (ainda) tem a ideia, falsa e pós-moderna, de que a nossa liberdade é ilimitada e que quaisquer condicionalismos a essa mesma liberdade a põem em causa. No entanto, quer a Filosofia quer a nossa experiência da realidade nos mostram que a liberdade absoluta, não condicionada, é um mito. Há, pois, que redefinir o nosso conceito colectivo de liberdade e nele admitir a possibilidade e a necessidade de ela ser condicionada. Ora, é precisamente da arte de conciliar a nossa liberdade com os seus condicionalismos que trata a ética. Escrevia S. Paulo (1 Cor 6,12) que “tudo me é permitido, mas nem tudo me convém”. Assim, pois, somos nós chamados a entender que nem tudo o que nos é permitido nos convém.


Por outro lado, a Cidadania, que podemos entender como uma extensão da própria Ética, numa vertente direccionada para a integração do ser humano na sua sociedade. Apelo aqui a uma mobilização de cada um no sentido de se auto-responsabilizar na construção de uma sociedade melhor. É um dever inalienável e o único caminho de futuro para o cumprimento de uma ambição mais do que legítima, a de deixarmos um mundo melhor para os nossos descendentes. A Cidadania traduz-se, claro, no modo como nos desacomodamos, intervimos e participamos na construção de uma sociedade ao mesmo mais tempo mais justa e mais livre. É certo que a democracia cntemporânea retirou várias armas a quem quer desinstalar-se (a seu tempo, cá voltaremos), mas, ainda assim, é uma irresponsabilidade de cada um demitir-se do processo de decisão e de crescimento de uma sociedade.


E na prática, perguntar-me-eis? Bem, na prática, tudo conta! Desde o modo como me levanto de manhã até à maneira como decido concorrer à Presidência da República. E tudo o resto pelo caminho: ser responsável nos meus estudos; ser motor de alegria no meu meio profissional, na minha família e com os meus amigos; escrever num blog; votar; assinar uma petição por uma causa justa; participar numa manifestação; promover o outro que, no meu próprio meio, é desvalorizado; dar uma parte do que tenho a quem mais precisa; criar um grupo de voluntariado; etc., etc., etc. …


Claro que podemos optar pelo caminho contrário, por nos demitirmos da nossa responsabilidade, por nos deixarmos adormecer neste torpor colectivo que parecemos atravessar. Mas pergunto: estaremos a fazer o que nos convém? Estaremos a viver à altura do nosso potencial, à altura do nosso dever?


Deparei-me hoje, por acaso, com o seguinte excerto de Emil Cioran, retirado de Do inconveniente de ter nascido: “Deveríamos repetir a nós próprios todos os dias: Sou um daqueles que, entre milhares, se arrastam pela superfície do globo. Essa banalidade justifica qualquer conclusão, qualquer comportamento ou acto: deboche, castidade, suicídio, trabalho, crime, preguiça ou rebelião. […] E daí se conclui que todos nós temos razão em fazer o que fazemos.” É precisamente este tipo de lógica que nego – defendo uma responsabilidade pessoal por parte de cada um para consigo próprio e para com todo o mundo.


O potencial de mudança reside dentro de cada um, a partir do modo como nos relacionamos com o mundo em que vivemos. Possa cada um de nós ser motor de uma mudança de que cada vez estamos mais necessitados!

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Universidade de Coimbra - Que futuro?

Caros amigos,

Antes de mais, gostaria de partilhar convosco a encruzilhada em que sinto que me meti, logo que optei por escolher o “Futuro da Universidade de Coimbra” como tema desta minha primeira intervenção.

De facto, o tema é demasiado amplo para que consiga aqui abordar as inúmeras possibilidades que encerra. Apesar disso, e visto que “nos” encontramos perto de eleger aquele será o próximo Reitor da UC, é agenda do dia reflectir sobre quais deverão ser as principais orientações estratégicas da UC para os próximos quatro/cinco anos.

Estudo há cinco anos na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, que foi a minha primeira escolha no acesso ao Ensino Superior. Houve uma altura do meu percurso académico em que, garanto-vos, tinha pouquíssima estima pela Universidade (ou, sejamos justos, pela faculdade) e cheguei a jurar que nunca faria aqui mestrado. Inclusivamente, cheguei a recomendar a estudantes do ensino secundário que não escolhessem Coimbra. A minha frustração não se devia a más notas, devia-se apenas ao facto de sentir que havia à minha volta instituições do Ensino Superior mais valorizadas pelo mercado de trabalho e em que o ensino – pelo menos a acreditar nas palavras dos meus amigos que as frequentavam – era verdadeiramente mais atractivo. Em cinco anos, vi a Universidade de Coimbra ser ultrapassada em várias áreas pela Universidade Nova de Lisboa, pela Universidade de Aveiro, pela Universidade Católica, para citar apenas alguns exemplos. E, depois do Processo de Bolonha, assisti a uma fuga enorme de recém-licenciados que escolhem outras universidades – portuguesas ou europeias – para fazer mestrado. Este sentimento não passava disso mesmo: um sentimento. Mas quando sentimentos deste tipo são generalizados e se tornam conversa de café, é porque algo está mal.

Desabafo à parte, não poderia pensar hoje de forma mais diferente. Nos últimos três anos tive a oportunidade de trabalhar activamente numa organização -a AIESEC - que, através dos estudantes, professores e empresas com quem me permitiu contactar, me fez perceber que a Universidade de Coimbra tem, sim (!), a capacidade de formar estudantes únicos em todas as áreas. O estudante de Coimbra é um estudante resiliente, crítico e inovador que estuda num ambiente académica privilegiado e que tem que ser capitalizado.

Uma Universidade como a de Coimbra, não pode querer para si um futuro que não seja ser a referência nacional no Ensino Superior e uma referência no Ensino Superior Europeu. Para tal, numa análise simples, poderão contribuir dois factores críticos de sucesso: (1) Investigação e (2) Taxa de Colocação dos estudantes no mercado de trabalho da sua área.

Em relação ao factor Investigação, julgo que a sua essencialidade é óbvia. Primeiro, porque só boa investigação atrairá os melhores estudantes aos cursos pós-graduados da Universidade; segundo, porque uma investigação que gere receita é remédio (quase) santo neste contexto de cortes no Ensino Superior; e terceiro, porque a projecção mediática da boa investigação trará auto-estima aos alunos e docentes (veja-se, a este propósito, as boas práticas da FCTUC), bem como renome à Universidade.

Neste campo, e apesar da aposta dever continuar, parece-me que a Universidade está bem desperta. O problema é que insiste em continuar a dormir no que toca ao factor “taxa de colocação” visto que, salvaguardadas as excepções, poucos cursos se preocupam verdadeiramente com a colocação dos alunos que formam.

As estatísticas dizem que 99% dos estudantes são colocados na primeira fase em Coimbra. Mas dizem também que 1/3 desses alunos queria ter entrado noutra Universidade. Fica claro que a UC não é a primeira escolha entre os estudantes e, face a isto, cumpre tentar perceber o que é que motiva a generalidade dos estudante de hoje, a escolher uma Universidade.

O jovem de hoje em dia está interessado em escolher a Universidade que lhe ofereça melhores condições para combater o maior problema social dos dias de hoje: o desemprego. Quanto mais provas a Universidade der de que o seu ensino é reconhecido e acreditado pelo mercado de trabalho, mais hipóteses tem de atrair os melhores alunos.

Dar provas neste campo poderá significar inúmeras coisas. Implicará, por um lado, uma verdadeira estratégia de aproximação Universidade/Empresa (mais uma vez, atente-se às boas práticas da FCTUC) e, por outro lado, uma verdadeira preocupação e aconselhamento dos gabinetes de saídas profissionais. Poderá também implicar uma verdadeira estratégia de marketing na promoção dos cursos da UC e uma maior capitalização das redes de alumni que, em Portugal, ao contrário de países como os Estados Unidos, são tão mal trabalhadas.

Os mais cépticos e conservadores, dirão que isto é colocar a Universidade a fazer o papel do estudante. Pelo contrário, julgo que estes são passos que poderão levar a Universidade a criar uma cultura orientada ao sucesso que, sem descaracterizar o que é típico no estudante de Coimbra, irá formar trabalhadores mais dinâmicos, mais capazes, e colocar a Universidade de Coimbra onde merece: no topo.

Antes de terminar, gostaria apenas de deixar claro que alguns dos problemas identificados e soluções apontadas, não servem para todosos cursos. A UC tem óptimas práticas de sucesso nomeadamente em faculdades como a FPCEUC e a FCTUC, e o factor “taxa de colocação” não é determinante para que a UC seja a primeira escolha em determinados cursos.

Termino esta reflexão com a ideia com que comecei: toda esta abordagem poderá parecer redutora face à amplitude do tema, pelo que o debate, que é afinal o objectivo deste espaço, é muito bem-vindo.

Que Universidade de Coimbra imaginamos no futuro?

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

"Humanismo desumano"

Caros amigos,

Como esta é a minha primeira intervenção no blogue, vou tentar partilhar de uma forma perceptível, um assunto, ou se preferirem, um pensamento/preocupação que me tem feito reflectir nestes últimos tempos.

E refiro-me à crise que a sociedade actual atravessa, não necessariamente a económica e financeira da qual já estamos saturados, mas à componente 'silenciosa' de uma crise que se arrasta há mais anos.

Neste sentido, e a meu ver, podemos e devemos ser nós, os jovens, enquanto actualidade e futuro desta sociedade global, a definir o mundo em que queremos viver. Ou será que vamos ficar eternamente à espera que ele se adapte a nós?

Afinal de contas, temos tudo! Temos saúde, vitalidade, ideias, sonhos... temos críticas! Então, porque não usar essas 'armas' para erguermos os nossos próprios princípios?! Os nossos valores! E mais do que isso, aceitar redefini-los a cada dia, a cada reflexão pessoal, a cada pensamento partilhado.

É nesta base que antevejo possível a continuidade de uma sociedade razoavelmente saudável. Não que tenhamos que viver exclusivamente numa filosofia altruísta, mas antes que se reconheça a importância da concretização individual, sem que para isso seja preciso ser indiferente a tudo o resto.

Na prática, quanto tempo temos hoje para sequer reflectir sobre o que fizemos ao longo de um dia?!... Por vezes nem cinco minutos. Uma sociedade que 'evolui' a passos largos para uma época em que muito provavelmente a maioria de nós nem poderá usufruir da sua reforma. É isto que queremos? O desenvolvimento económico a todo o custo?! "Viver para trabalhar", ao invés de "trabalhar para viver"?! Obviamente que as coisas não se pautam neste padrão "a preto e branco", mas o que me preocupa é que para lá caminhamos.

Mas mesmo assim, acredito, ou pelo menos, quero acreditar na vontade de progressão e de desenvolvimento social das gerações mais novas. Afinal, como diz o povo, "o que chega nunca é tarde", e numa altura de 'crise de valores' chegou a oportunidade singular de assumirmos o rumo que, individualmente ou colectivamente, queremos tomar.

E é certamente por isso que sinto o orgulho de poder partilhar os meus pensamentos neste blogue... com vocês. Não que espere opiniões semelhantes, mas antes que vos possa transmitir a necessidade de reflectir o nosso futuro e sobretudo que possa aprender convosco.


Saudações académicas,

Rúben Rodrigues